O Discord esteve presente nas manchetes dos jornais nesta semana. No entanto, não foi pela interatividade que a plataforma promove ou por uma nova gama de funcionalidades. A rede social acabou virando alvo de investigações por conta da ação de criminosos que criaram canais nos quais espalham conteúdos de apologia ao nazismo, racismo, pedofilia e exploração sexual. Na terça-feira, 27, a Polícia Civil do Rio de Janeiro apreendeu dois adolescentes suspeitos de cometerem violência sexual e induzir meninas à automutilação e ao suicídio pela plataforma. Um dos adolescentes, de 17 anos, é apontado pelas investigações como um dos principais líderes de um dos grupos que agem pelo aplicativo. Em São Paulo, quatro pessoas foram presas acusadas de ameaçar e estuprar ao menos duas meninas, menores de 18 anos, que conheceram em um aplicativo. A plataforma permite que o usuário converse por áudio, texto e vídeo. O Discord é bastante utilizado por gamers para estabelecer contato com amigos e outros internautas para jogarem online, mas evidentemente tem sido usado para outros fins.
Segundo o advogado Luiz Augusto D’Urso, especialista em crimes cibernéticos, a maioria dos criminosos é adolescente. Ele explica que os infratores usam o Discord para se comunicar com garotas e iniciar uma relação de confiança. Com o passar do tempo, eles conseguem algum tipo de material pornográfico, pedindo para que a vítima envie fotos ou vídeos. Quando o material é enviado, ela passa a ser vítima de extorsão, que, segundo o especialista, pode até ser enquadrado como estupro virtual. “O crime ocorre quando os adolescentes exigem que a vítima realize outros atos pornográficos na câmera, fazendo uma live pelo Discord”, explica.
O advogado acompanha de perto uma das vítimas. Segundo ele, o abalo psicológico é profundo. Muitas garotas se rendem aos criminosos para que eles não divulguem conteúdos realizados sob chantagem. “Algumas estavam sob absoluta coação e diante de extorsão. Para aquele conteúdo não vazar, ela se rendeu por semanas e até meses a esse absurdo, causando marcas irreversíveis. Esses jovens mudaram, lamentavelmente, a história dessas adolescentes”, relatou. O advogado pede para que os pais acompanhem a utilização da internet pelos seus filhos. Em especial, das plataformas que não possuem sede no Brasil, o que dificulta a comunicação. “A própria decisão judicial não é cumprida pelas plataformas”, destacou D’Urso. “É por isso que o efeito preventivo é muito mais importante. Para que os pais, principalmente de garotas adolescentes, peçam a elas que não se relacione com desconhecidos na internet e que conversem com seus pais. É muito importante a escola, os pais e o próprio Estado estarem atentos a esses problemas sociais que ocorrem na internet.”
Na visão do especialista, o Discord precisa criar canais de denúncias mais efetivos e próximo do usuário. O objetivo é fazer com que a vítima denuncie o crime e que plataforma identifique os autores e, em seguida, bana-os. De acordo com D’Urso, mesmo o conteúdo sendo criptografado, a plataforma consegue ter algum tipo de controle. Ele também pede para que o Discord e outras redes socias cumpram as decisões judiciais. “Mesmo não tendo sede no Brasil, elas precisam estar em comunicação com as autoridades policiais para colaborar na identificação e punição dos criminosos”. A reportagem do site da Jovem Pan procurou a plataforma, que não retornou até o fechamento desta reportagem.
Converse com seu filho
O diálogo é a melhor solução para evitar novas vítimas do crime. Segundo a psicóloga Rosana Silva, as redes sociais trazem muitos benefícios. Entre elas, a sociabilidade. Porém, a socialização acaba se tornando mais vaga pelas plataformas. Isto porque as pessoas não vivenciam isso de forma real. “A pessoa não sabe com quem se está falando com alguém de sua idade. Acaba se isolando socialmente. O diálogo aberto com os filhos é imprescindível para evitar esse tipo de problema”, orienta Rosana. A profissional destaca o impacto que a vítima deste tipo de crime pode sofrer. Normalmente, o abusador alicia a vítima para conseguir seu objetivo. Isso a deixa envergonhada e com receio de pedir ajuda. Além disso, o impacto emocional pode ser até irreversível. A pessoa pode desenvolver depressão, baixa autoestima e ter sua confiança comprometida. Também passa a sofrer com síndrome do pânico e pode até mesmo perder a vontade de sair de casa. “É importante a família estar atenta a isso. E acredito que o maior canal para ajudar o jovem é comunicação”, ressalta.
Rosana reforça ainda que o acolhimento também pode colaborar para que jovens cometa o ato. “É primordial para evitar essa prática. Muitas famílias acham seguro ver o jovem trancado no quarto mexendo no computador. Mas esse isolamento pode ser prejudicial. Ele pode estar tendo acesso a diversos conteúdos que pode prejudicá-lo. O jovem tem essa dificuldade de se comunicar, por isso essa aproximação é importante”. Outro conselho é monitorar o que os filhos procuram na web. “Peça para não trancar a porta do quarto ou deixar o computador em uma posição que permita o pai ou a mãe veja o que ele está acessando”, finalizou.
Fonte: Jovem Pan