O advogado Cristiano Zanin Martins será o próximo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), instância máxima do Judiciário brasileiro. Escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para ocupar a vaga deixada por Ricardo Lewandowski na Corte, o também professor de direito passou por sabatina na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal na última quarta-feira, 21, e teve seu nome aprovado em plenário, com 58 votos favoráveis e 18 contrários. Com o resultado, a próxima etapa será a posse do novo ministro na Corte, marcada para o dia 3 de agosto, após o recesso do Judiciário. O novo membro do Supremo esteve na Corte na tarde da quinta-feira, 22, quando se reuniu com a ministra Rosa Weber, presidente do STF, por cerca de 40 minutos. Ele também cumprimentou os ministros da Corte e conversou com a cúpula administrativa do STF para obter detalhes sobre como será o funcionamento de seu gabinete. Mesmo com a aprovação e resultado positivo, ainda paira uma dúvida sobre a indicação de Zanin: o advogado deve se declarar suspeito em casos que envolvam o presidente Lula?
A questão chegou a ser levantada inúmeras vezes durante a sabatina na CCJ. O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) também questionou o advogado, que falou em se declarar impedido de julgar ” todo processo que tenha atuado como advogado, seja qual for a parte que tenha patrocinado seus direitos”. “Não poderei julgar esses processos no Supremo. Afinal, existe uma lei específica que impede aquele que funcionou na causa de vir a julgar. Isso é muito claro e deverei seguir esse impedimento em qualquer causa que tiver atuado”, alegou Cristiano Zanin. No entanto, quando perguntado sobre processos futuros envolvendo o presidente Lula e outros réus já defendidos pelo advogado, o novo ministro relativizou e disse que vai avaliar os autos caso a caso. “Não acredito que colocar uma etiqueta [da Lava Jato], colocar um nome, pode ser um critério para aquilatar a suspeição e impedimento. Sem nenhuma crítica, no mundo jurídico todos sabemos que, no passado recente, quase tudo que funcionava em varas criminais, muitas vezes recebia a etiqueta de Lava Jato. Isso não é um critério para controle jurídico, mas sim o que a lei prevê", argumentou.
Embora advogado já tenha sugerido que deve se declarar impedido nos casos envolvendo o mandatário, entre juristas o entendido é ainda mais claro: Zanin é legalmente “obrigado” a se declarar suspeito em casos envolvendo o chefe do Executivo. “A rigor, o Zanin deveria se autodeclarar suspeito ou impedido nos casos envolvendo Lula. Isso por determinação da legislação processual. Ocorre que há precedentes de ministros que deveriam fazê-lo e não o fizeram. E vale lembrar que a suspeição decorre da relação pessoal entre Zanin e o presidente e não somente da atuação como advogado”, explica o advogado constitucional Acacio Miranda da Silva Filho, doutor em direito constitucional pelo IDP/DF e mestre em Direito Penal Internacional pela Universidade de Granada, em conversa com o site da Jovem Pan.
A suspeição é declarada quando o juiz fica impossibilitado de participar do julgamento de terminado caso em razão da existência de vínculo subjetivo. Na hipótese, seria a ligação com Lula e com os processos da força-tarefa, que tiveram atuação de Cristiano Zanin em favor do atual presidente. “A principal função desse instituto é garantir a imparcialidade do julgador”, comenta Antonio Carlos de Freitas Junior, mestre em direito constitucional pela Universidade de São Paulo, citando artigo 145, IV, do Código de Processo Civil, que prevê a suspeição caso o juiz tenha afinidade por uma das partes. “Há suspeição do juiz: amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados; que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo; que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa; quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes. (…) Interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes. Poderá o juiz declarar-se suspeito por motivo de foro íntimo, sem necessidade de declarar suas razões”, diz o trecho.
Ainda que salte aos olhos e seja motivo louvável de questionamentos pelos senadores e internautas, juridicamente falando, a avaliação é que a ocorrência de impedimento é “bastante comum” no Judiciário brasileiro. Um exemplo recente, ocorrido em maio de 2022, envolve o ministro André Mendonça. O mais novo magistrado da Corte se declarou suspeito em um caso que analisada atos do Ministério da Justiça e Segurança Público, uma vez que, na época da produção dos documentos investigados, Mendonça era chefe da pasta. De acordo com os especialistas, também é comum acontecer o impedimento ministro já atuou em determinado processo antes dele ser indicado à Suprema Corte, o que é a situação de Cristiano Zanin. Nestes casos, se autodeclarado suspeito, o magistrado não participa do julgamento e, obviamente, também não vota . “Vale ressaltar que a legislação também prevê outras hipóteses de suspeição e impedimento, todas relacionadas à relação entre julgado e julgador”, conclui Freitas Junior.
Fonte: Jovem Pan