Relatório recente da consultoria mostra que informações socioambientais e de governança disponíveis e mensuráveis ainda deixam a desejar e trarão desafio extra para setor financeiro cada vez mais regulado
A consultoria internacional Oliver Wyman, especializada em soluções para o mercado financeiro, acaba de divulgar um relatório em que analisa uma série de ferramentas usadas por organizações ao redor do mundo para mapear seu desempenho nos mais diversos aspectos das questões ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança corporativa) e climática. A conclusão é que, apesar de já existir muitas opções no mercado, elas não conseguem ainda atender a todas as necessidades da agenda de sustentabilidade corporativa, lista que aumenta a cada dia. Parte do problema, porém, está na própria mensuração e disponibilidade de dados pelas empresas.
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No relatório foram levantados mais de 2,5 mil ratings, scores, parâmetros, projetos e modelos de implantação dentro da temática ESG, alguns mais gerais e outros mais específicos e setoriais. Só o setor bancário, por exemplo, é alvo de 26% deles. São ferramentas usadas pelas empresas para mensurar riscos, avaliar performance operacional, desenvolver e monitorar indicadores de compensação e remuneração, além de avaliar fornecedores e cadeia de suprimentos. Muitos a própria consultoria ajuda a implementar para clientes.
O problema não é só a quantidade, mas que ainda há áreas pouco cobertas. Uma instituição financeira, por exemplo, trabalha com mais de uma - não é raro quem esteja com cinco ou mais. Com as exigências regulatórias e de outras natureza se aperfeiçoando, a preocupação do setor financeiro aumenta.
Na opinião de Guilherme Xavier, sócio Financeiro e Infraestrutura e líder da Plataforma de Clima e Sustentabilidade da Oliver Wyman, o caminho natural é que as instituições financeiras criem elas mesmas ferramentas internas, mais personalizadas e avançadas.
“Os bancos vão ter que criar suas próprias abordagens. Vão ser perfeitas? Não, mas assim poderão ter maior capacidade para ter acesso a todos os dados que são necessários para atender ao Banco Central e conhecer seus clientes mais profundamente”, acredita o executivo.
Ao comparar a avaliação feita por ratings financeiros, como os de classificação de risco das agências Moody"s, Fitch e S&P com os ratings ESG no mercado de diversos provedores, a Oliver Wyman percebeu que no primeiro grupo há um grande alinhamento sobre a performance das empresas analisadas, enquanto o segundo grupo têm notas muitos divergentes para mesmos parâmetros de mesmas empresas.
A explicação se deve a dois fatores. O primeiro, as variáveis econômicas e financeiras para classificação de risco de crédito já são mais conhecidas e há anos aperfeiçoadas, o que não é o caso dos indicadores ESG. E, adicionalmente, não há parâmetros unificados para as questões socioambientais e climáticos - boa parte das metodologias estão ainda sendo testadas e melhoradas.
“Falta transparência nas metodologias, a cobertura ainda tem escopo limitado, especialmente em países em desenvolvimento, como o Brasil ”, explica Xavier. “Isso significa que não devemos usar Ratings ESG? Não, apenas significa que os problemas, as falhas, precisam ser aperfeiçoadas dentro da jornada”, completa.
O tema da transparência de dados foi, inclusive, um dos principais assuntos abordados na semana do clima em Nova York no fim de novembro. “Vimos em painéis que acompanhamos a importância da padronização para avançarmos na divulgação de dados, até chegarmos ao ponto de ter robustez de informações, confiáveis, ligadas a clima para o mercado financeiro”, comenta Gabriela Bertol, principal da prática de Serviços Financeiros da Oliver Wyman no Brasil.
Ela chama a atenção para a discussão global da falta de padronização de indicadores, métricas e ratings, algo que ficou evidente nos dias de evento, mas que, na prática, as empresas e as instituições financeiras se deparam no dia-a-dia. “É um reflexo da falta de maturidade das informações e dados, e da baixa confiança na solidez das metodologias hoje no mercado. Sem dados não dá para trabalhar, não conseguimos definir metas internas, comunicar e nem comparar pares”, pontua a executiva.
Para uma instituição financeira cobrir a maior parte do escopo, é preciso contratar vários fornecedores. O relatório da Oliver destaca, por exemplo, que o MCSI e a Sustainalytics ajudam a monitorar a biodiversidade, enquanto a Bloomberg tem parâmetros renomados em diversidade e inclusão de gênero. A própria Oliver tem sob seu guarda-chuva duas ferramentas, a Mercer e a Marsh. A primeira trabalha com rating ESG e ajuda em processos de due dilligence, a exemplo da questão de transição climática. Já a Marsh tem foco maior em riscos ESG, com pesos diferentes para cada indústria.
A iniciativa da consultoria em colocar lado a lado em um relatório várias metodologias - comumente usadas pelo mercado financeiro para avaliar suas carteiras de crédito e clientes diversos, além de indicadores internos - foi pensada porque o setor está sendo cada vez mais pressionado para puxar essa demanda. No exterior e também no Brasil.
Seguindo um movimento global, desde julho, novas regras do Banco Central passaram a vigorar e exigir dos bancos mais análise de dados sobre aspectos ESG, tanto em investimento, quanto em serviços e produtos de crédito, mercado de capitais e outros. Passou a ser exigida uma Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC), que pede, por exemplo, a contabilização de potenciais perdas que surjam de fenômenos relacionados a mudanças climáticas, como secas, inundações, incêndios, etc.
As exigências variam conforme o tamanho e complexidade das operações, e também entram em vigor paulatinamente. Mas o fato é que as instituições vão precisar observar princípios e diretrizes social, ambiental e climática na hora de conduzir negócios, montar suas atividades e processos, bem como na relação com clientes e fornecedores.
O problema é que não é tão simples quanto parece, na opinião de Xavier. “No Brasil, a resolução do BC é importante, mas muito genérica. O processo que está acontecendo esse ano vai ter muita variabilidade grande de parâmetros e divulgações, e o BC vai ter que entender como interpretar o que os bancos conseguem fazer. O BC fez certo agora [ao exigir algumas informações], mas acredito que a próxima rodada de regulação será mais prescritiva”, comenta o executivo.
Ele reitera porém que um dos grandes desafios está nas análises. "São todos assuntos emergentes e a informação que tem para gerar essas análises é limitada”, pontua, citando como exemplo a dificuldade de entender os riscos de transição energética de empresas de geração de energia. “As áreas de Relações com Investidores não têm informações sobre risco climático”, lembra.
Mas parece ser um caminho sem volta. E muitas instituições financeiras já estão caminhando. Os bancos brasileiros Itaú Unibanco e Bradesco, e bancos internacionais que atuam aqui, como o espanhol Santander, o francês BNP Paribas, o suíço Credit Suisse, entre outros, já aderiram à Aliança Bancária por Zero Emissões Líquidas, (Net Zero Banking Alliance, NZBA, em inglês). Em teoria, isso significa que se comprometem em alinhar seus portfólios para atingir a neutralidade em emissões de gases-estufa até 2050.
Guilherme Xavier é sócio Financeiro e Infraestrutura e Líder da Plataforma de Clima e Sustentabilidade da Oliver Wyman
Divulgação/ Oliver Wyman
Fonte: Valor Invest