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O papel das empresas na democratização do acesso ao alimento orgânico


Próximo ao dia mundial da alimentação, no domingo dia 16 de outubro, este artigo joga luz em como empresas, sociedade e fornecedores podem contribuir para garantirmos segurança alimentar e melhoria da nutrição Domingo 16 de outubro é o dia mundial da alimentação. A data joga luz ao indispensável tema da segurança alimentar e nutricional, direito humano básico expresso no segundo dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU: fome zero e agricultura sustentável. Alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição requer uma verdadeira transformação dos sistemas agroalimentares e as empresas da cadeia de produção e distribuição de alimentos desempenham um papel fundamental nesse processo.

O mundo enfrenta hoje um momento de grave crise alimentar. Resultados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil apontam que, em 2022, mais de 33,1 milhões de brasileiros convivem com a fome. Somado à pandemia e ao enfraquecimento de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional, o quadro de fome se agrava com a alta dos preços de alimentos após a eclosão da guerra na Ucrânia em fevereiro deste ano.

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As mudanças do clima são outro importante fator de risco. Relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas apontam para o aumento na intensidade e frequência de eventos extremos, como inundações, secas e deslizamentos de terra. O resultado, já em curso, se manifesta não apenas no agravamento da fome e na inflação de alimentos, mas também no aumento da pobreza e do desemprego.

No Brasil, a soberania alimentar e nutricional é ameaçada não apenas pelos impactos na quantidade de alimento produzido e falta de acesso a eles, mas também pela sua qualidade. A flexibilização no uso de agrotóxicos se intensificou nos últimos anos via mudanças normativas, resultando em aumento de consumo e número de registros desses produtos.

Em contraponto, a agricultura orgânica ganha cada vez mais espaço como alternativa capaz de produzir alimentos saudáveis, atrelando geração de renda no campo, conservação de recursos naturais e resiliência frente aos impactos das mudanças climáticas. O último levantamento da Associação de Promoção dos Orgânicos (Organis) sobre o segmento aponta alta de 30% nas vendas de produtos orgânicos em 2020, movimentando R$ 5,8 bilhões.

Apesar de promissora, a agricultura orgânica como propulsora da tão necessária transformação nos sistemas agroalimentares só será possível quando os agricultores familiares forem vistos e fortalecidos como peça chave na cadeia de valor. Eles correspondem a quase 80% dos estabelecimentos agropecuários no Brasil e são responsáveis pela produção de grande parte dos alimentos que compõem a base da alimentação dos brasileiros e que garantem a segurança alimentar e nutricional da população.

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O apoio à transição agroecológica e conversão para a produção orgânica por parte dos pequenos agricultores demanda adequações de políticas públicas e práticas empresariais, além da mudança nos padrões de consumo. Sem a atuação conjunta e integrada desses atores, a agricultura familiar perderá espaço no mercado e a demanda dos consumidores por alimentos mais saudáveis será atendida majoritariamente pelos grandes produtores, intensificando ainda mais as desigualdades no meio rural.

Essa é a principal motivação que levou o Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas a elaborar, de forma colaborativa com uma rede de mais de 50 organizações, recomendações para tornar a cadeia mais favorável à conversão da agricultura familiar para a produção orgânica. Destacam-se, a seguir, as principais recomendações para redes varejistas e indústrias alimentícias.

Práticas diferenciadas de gestão de fornecedores:

Tradicionalmente, as políticas de compras costumam ser padronizadas e adequadas para grandes fornecedores. A criação de contratos específicos para compra de produtos de agricultores familiares orgânicos e em conversão é o primeiro passo a ser dado. Contratos simplificados e flexíveis que envolvam pontos como: preços diferenciados, aceite de alimentos da transição agroecológica, garantia de compra, compartilhamento das perdas do processo de conversão, prazos de pagamento reduzidos, flexibilidade nos pedidos conforme sazonalidade, venda não consignada, dentre outros.

Também são recomendadas práticas como: a antecipação de pagamentos, que possibilita ao pequeno agricultor viabilizar investimentos na propriedade; sensibilização e capacitação de equipe de compras para incorporação de tais aspectos.

Apoio ao acesso a recursos financeiros:

O acesso a recursos financeiros possibilita ao agricultor orgânico (ou em conversão) realizar adequações na propriedade, arcar com custos da certificação, substituir e adquirir novos insumos, dentre outras modificações. Contemplar, na gestão empresarial de fornecedores, o suporte no acesso e uso desses recursos é um diferencial muito importante. A empresa pode: apoiar a divulgação de linhas de créditos existentes e facilitar o diálogo com bancos; alinhar o contrato de compra ao período do financiamento; criar linhas de crédito para apoiar a conversão ou a certificação orgânica de fornecedores ou, ainda, compartilhar com eles seus custos.

Conscientização dos consumidores:

Práticas simples, porém muito necessárias, recaem na divulgação de aspectos como a relevância da agricultura familiar, os benefícios da produção e consumo de alimentos orgânicos e a sazonalidade na agricultura orgânica. Um exemplo para o varejo seria adotar medidas para informar a origem e especificidades dos alimentos e o perfil dos produtores, ou promover eventos como dias de feira orgânica a preço do produtor, repassando toda a receita para ele e ampliado o acesso a esses alimentos hoje tidos como produtos de nicho.

Finalmente, é urgente a adoção de práticas empresariais que combatam as dinâmicas de mercado hoje pautadas na desvalorização da agricultura familiar e na concentração de poder na cadeia de valor. Ainda, ao transformar sua atuação, as empresas podem também conquistar uma posição de liderança no segmento em que atuam. Somente com essas mudanças, atreladas à implementação de políticas públicas e engajamento do consumidor, será possível fazer a transição necessária para sistemas agroalimentares de fato sustentáveis.

Sobre a autora:

Ana Moraes Coelho é coordenadora do Programa Sustentabilidade nas Cadeias de Valor da do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Escola de Administração da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (EAESP-FGV). É professora do Master em Administração – Linha Sustentabilidade e professora convidada da Escola de Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade (ESCAS) do Instituto de Pesquisas Ecológicas. Possui mestrado em conservação ambiental e desenvolvimento sustentável pela mesma instituição (ESCAS).

Ana Moraes Coelho é coordenadora do Programa Sustentabilidade nas Cadeias de Valor do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Escola de Administração da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (EAESP-FGV)

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