Após o desencadeamento da Operação Maligno, que desarticulou uma Organização Criminosa (Orcrim) que, por meio de uma pseudo-cooperativa, firmou contratos para prestação de serviços essenciais com pelo menos 20 municípios alagoanos, movimentando R$ 243 milhões, entre os anos de 2020 e 2023, o Ministério Público Estadual (MPAL) se prepara agora para analisar os dados contidos nos materiais apreendidos, para que seja investigado um possível envolvimento de gestores públicos no esquema.
O processo de extração dos dados telemáticos dos itens apreendidos será feito por meio de um moderno aparelho adquirido pelo MP e que consegue retirar todos os dados contidos nos aparelhos. Após isso, o Núcleo de Gestão da Informação (NGI) do MP/AL - que foi responsável, em grande parte, pelo êxito da Operação Maligno, considerando que eles coletaram todos os dados que embasaram a operação - fará um relatório a ser enviado aos promotores responsáveis, que vão avaliar as providências a serem adotadas.
"Tudo o que foi apreendido está dentro de invólucros plásticos com presilhas numeradas. Como temos um advogado envolvido, embora ele não estivesse no exercício da função, para dar uma credibilidade maior para essa extração de dados, vamos vai partir do pressuposto de que ele foi preso no exercício da função da advocacia. Já chamamos a Diretoria de Prerrogativas da OAB e o advogado que ele [Frederico Benigno, líder da Orcrim] tem em Maceió para acompanhar o rompimento dos lacres. Vamos romper e mostrar tudo o que temos. Depois devolveremos aos invólucros, fecharemos novamente e o próximo rompimento será para a extração dos dados, seja para análise documental ou para telemática", explica o promotor Frederico Alves.
Não há um prazo para que a extração dos dados seja concluída, considerando que esta não é a única operação deflagrada pelo MP em Alagoas. Segundo o promotor, o importante é saber que, com os dados em mãos, a equipe vai se debruçar para analisar a participação ou não de agentes públicos. "Vamos analisar: tem agente público? Quem são? Tem agente com prerrogativa de função? Se tem, é a Procuradoria Geral de Justiça [PGJ] que passa a investigar, com autorização do Tribunal de Justiça, se for o caso. Se não for, vamos aditar essa denúncia e incluir os agentes. Com isso, certamente o processo deve sair da 17ª Vara e ir para o TJ, pois se tiver prefeito envolvido, o foro é no Tribunal de Justiça. E caberá ao TJ decidir se desmembra o processo, para que possamos reassumir novamente. Temos que esperar, mas eu acho que a República pode vir abaixo com a extração dos dados, por isso precisamos ter cautela", explica o promotor.
Em uma das planilhas apreendidas com Betuel Ferreira de Souza, alvo da Maligno em Japaratinga, no interior de Alagoas, há uma rubrica com o nome "logística do dinheiro", onde consta o pagamento de R$ 15 mil para um policial e menciona o prenome de um secretário de um dos municípios que mantinha contrato com a cooperativa, que receberia R$ 30 mil por mês. Mas por enquanto, tudo não passa de indícios.
Por hora, o que se tem de respostas à operação, além das cinco prisões, apreensões dos materiais que serão analisados e da quantia de R$ 649 mil em espécie - dinheiro que foi encontrado na casa de um dos alvos da operação e que estava guardado em caixas com os nomes dos municípios -, é a suspensão de todos os contratos firmados entre as prefeituras alagoanas e a Moderniza, por decisão da 17ª Vara Criminal.
Esta semana, mais uma vitória: a Justiça Trabalhista, a pedido do Ministério Público do Trabalho [MPT], por meio de uma ação civil pública, também determinou a suspensão dos contratos da falsa cooperativa com todos os municípios de Alagoas. "Foi mais uma camada jurídica que nós criamos de proteção. Foi uma vitória. Golpeamos o núcleo privado, que é onde a gente pode atuar. Demos uma porrada muito forte, que deu reverberação em toda a estrutura pública", afirmou o promotor.
Agora, uma preocupação tem sido com os verdadeiros trabalhadores vinculados à pseudocooperativa que, de fato, estavam prestando serviços aos municípios. Em breve, uma recomendação do MPAL será publicada para que cada gestão pública municipal identifique essas pessoas e faça a contratação delas, da maneira legal mais viável.
"Vamos conversar com o procurador-geral de Justiça para saber como o MP vai tratar essa questão das pessoas que estão sofrendo os efeitos colaterais da suspensão dos contratos. A princípio, no esboço, vamos recomendar aos municípios que façam a contratação direta desses funcionários depois de uma filtragem com quem, de fato, trabalha. Não vamos entrar em detalhes de como vai ser essa contratação. O gestor, com base na probidade, que é dever dele, vai fazer uma seleção. Depois dessa filtragem, as pessoas deverão constar no Portal da Transparência, pois isso vai ser uma exigência do Ministério Público", diz Frederico Alves.