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"As incorporadoras deveriam trabalhar em conjunto para melhorar os locais onde estão seus empreendimentos"

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Entrevista | Arthur Casas, arquiteto Arthur Casas, arquiteto

Bob Wolfenson/Divulgação

Com 40 anos de carreira, Arthur Casas é um dos arquitetos mais incensados do Brasil. Seus projetos residenciais no país e no exterior são reconhecidos pela afetividade com o indivíduo e pelo uso do verde. Mais recentemente, seu escritório – fundado em 1999 – passou a ser bastante assediado pelo mercado imobiliário. “As incorporadoras perceberam que um trabalho autoral agrega valor aos empreendimentos”, analisa.

Nesta entrevista, Casas avalia o papel das empresas do mercado imobiliário e dos próprios arquitetos que assinam os projetos na transformação dos bairros e das cidades e defende ainda a criação de novos endereços de exploração do setor para compensar a escassez de terrenos e promover o desenvolvimento urbano dessas novas áreas. Sua inquietação atual é saber como o setor pode contribuir mais para a transformação dos espaços públicos.

Acompanhe a seguir.

Seu nome tem frequentado cada vez mais o mercado imobiliário de alto padrão. É uma tendência do seu trabalho?

Arthur Casas — Fazer edifícios é uma coisa nova para o escritório. Este ano, vamos crescer 30% em projetos para este mercado. Nós não éramos procurados antes porque nossos projetos são mais caros. O que acontece é que, hoje, as incorporadoras perceberam que o trabalho autoral agrega valor aos empreendimentos. O cliente de alto padrão é muito exigente e valoriza a arquitetura de qualidade. E quando se faz um edifício onde o metro quadrado custa R$ 35 mil, também não se pode entregar qualquer coisa.

Esse movimento dos escritórios para atender as incorporadoras qualifica o setor?

Sim, colocou a régua mais acima. As pessoas começam a discutir projetos. Antigamente, se comprava um imóvel de alto padrão de acordo apenas com a localização. Hoje, a incorporadora que constrói e o arquiteto que assina o projeto se tornaram parte do valor.

Você defende a exploração imobiliária em endereços fora dos bairros tradicionais. Por quê?

Em cidades como São Paulo, isso é fundamental porque não se consegue mais incorporar nos Jardins, por exemplo. Adoraria que as construtoras se mobilizassem para construir três ou quatro edifícios em lugares assim. Ajudaria na transformação das ruas e da cidade em si. No ano que vem, devemos lançar um projeto num bairro pouco conhecido da Zona Oeste, o Jardim das Bandeiras: a área residencial que não era desejada e agora virou um polo de edifícios legais feitos por outros escritórios. É preciso criar localizações na cidade para promover a transformação desses bairros.

Praça Henrique Monteiro, São Paulo (SP)

Studio Arthur Casas/Divulgação

É papel das incorporadoras contribuir para esse assunto?

Sinto falta de uma participação mais efetiva delas nesse sentido. As incorporadoras deveriam trabalhar em conjunto para melhorar os lugares onde estão seus empreendimentos, ainda que seja para vender mais apartamentos. As prefeituras, em um país pobre como o nosso, não têm dinheiro para isso.

É função do arquiteto contribuir para o bem-estar urbano?

Acredito que sim. O prédio precisa passar afetividade para as pessoas e a cidade. Como dizia o arquiteto Mario Botta, o edifício pertence à cidade, não a quem o construiu. As cidades europeias entenderam isso perfeitamente. Você não pode mexer nos edifícios históricos, pintar ou construir como se quer. Quando fizemos o projeto da loja da Natura em Paris, em 2005, lembro que precisamos aprovar com o arquiteto do quarteirão! Aqui no Brasil é ao contrário: existe uma legislação para garantir que cada um faça o que quiser, do jeito que bem entender.

Edifício Íbaté, São Paulo (PR)

Studio Arthur Casas/Divulgação

Você acha que falta estímulo para a participação dos arquitetos brasileiros no debate público sobre essas questões?

Nosso escritório sempre doou projetos com o perfil de melhoria do espaço público. Bancamos um estudo de adensamento do bairro do Pacaembu, entregamos outro projeto de reurbanização da Praça da Sé, doamos um para as incorporadoras de revitalização da Rua Henrique Monteiro. Na Bahia, ganhamos um concurso público para a área do Pelourinho, mas, com a troca de governo, o projeto parou.

O que me desanima nessa história toda é que não há continuidade do trabalho desenvolvido nas secretarias. O problema está no sistema que não funciona. Não acho que haja falta de vontade dos arquitetos em participar dessa conversa pública.

Edifício Bioma, São Paulo (SP)

Studio Arthur Casas/Divulgação

Seus projetos sempre priorizam o paisagismo, que agora se tornou relevante no segmento de alto padrão? Como avalia essa mudança?

Para mim, pessoalmente, a razão é muito simples: o edifício fica mais bonito e agradável, tanto para quem está morando nele, quanto para quem está passando na rua. O verde traz essa sensação. Nos bairros mais arborizados, sentimos essa diferença positiva. E os edifícios devem refletir essa relação.

Você menciona a afetividade como um valor nos seus projetos. A arquitetura brasileira é mais afetiva?

Não acho que a arquitetura brasileira tenha afetividade, exceto no trabalho do Niemeyer. O que temos de afetivo é a paisagem brasileira, e isso estamos perdendo ao destruir a Mata Atlântica e a Amazônia, por exemplo. O mar do nosso litoral e o clima agradável na maior parte do ano geram afetividade, e não estamos sabendo aproveitar isso.

Fonte: Valor Invest

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