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Caixa de autopagamento aproveita onda do smartphone e parece ter vindo para ficar

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Consumidores brasileiros estão entre os mais abertos à utilização de tecnologias, mostra pesquisa Carlos Lepique, de 80 anos, entra no supermercado Pão de Açúcar, coloca aproximadamente dez itens em uma cesta e se dirige, sem obstáculos, para um dos caixas de autopagamento da unidade localizada na Avenida Brigadeiro Luiz Antônio, na zona central de São Paulo.

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“Desde que foi instalado, prefiro usar o autopagamento. Primeiro porque eu não faço compras enormes e, em segundo lugar, porque é muito mais rápido. Às vezes até pega um pouco de fila, principalmente quando tem gente pesando muita coisa, mas não é nenhum bicho de sete cabeças."

Carlos Lepique, 80 anos, cliente que adotou o sistema de autopagamento em supermercado

Carol Carquejeiro/Valor.

O cliente é um dos milhares de consumidores do Pão de Açúcar e de outras redes varejistas que já estão se habituando a entrar e sair de uma loja sem interagir com nenhum funcionário, embora a loja ainda conte com metade dos caixas ocupados por atendentes humanos.

O sistema também chamado de self-checkout já está sendo usado por outras redes de supermercados, como Carrefour e Atacadão, ambas marcas do Grupo Carrefour.

Durante a pandemia, a companhia abriu duas unidades “autonômas” da bandeira Carrefour Express em ambientes controlados com experiência de compra sem nenhum tipo de mediação humana. Uma está no coworking CoW, no Brooklin, e outra está dentro do condomínio residencial Domo Life e Prime, em São Bernardo do Campo.

A Petz, rede de lojas de produtos para animais de estimação, é outra que já começou a investir na tecnologia.

“Possuímos 46 lojas com auto atendimento no caixa, em 14 Estados diferentes. A estratégia já faz parte da nossa rotina de expansão com processos que avaliam indicadores de experiência do cliente, produtividade e investimento, podendo ser uma solução para qualquer modelo e formato de lojas”, comenta o vice-presidente de operações da Petz, Rodrigo Cruz.

"Cerca de 40% dos clientes usam a tecnologia em nossas lojas e as avaliações são positivas."

Embora o “self-checkout” já esteja mais estabelecido em países desenvolvidos como os do norte da Europa e os EUA, uma pesquisa global da operadora de pagamentos Wirecard, realizada em 2020, apontou que os consumidores brasileiros são os mais abertos à utilização de tecnologias que tornem a experiência de compra mais conveniente.

Por exemplo, 82% dos brasileiros mostraram muito ou algum interesse em baixar um app para realizar autopagamento em lojas do varejo, contra apenas 57% dos norte-americanos e 51% dos australianos – a média global ficou em 71%.

“O movimento é imparável”, conforme reconhece o presidente do Sindicato dos Comerciários e da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah.

“Costumávamos fazer ações com carros de som na frente de supermercados. Dez anos atrás, chegaram a retroceder, mas hoje estão conseguindo implementar e não vamos conseguir mais impedir com carros de som”, declarou.

O presidente da UGT observa que o varejo como um todo passa por um processo de modernização constante há décadas.

“Começou com a leitura ótica, que no começo era caríssima e hoje qualquer pessoa física pode ter em casa de tão barata que ficou. E o autopagamento já tem duas décadas que vem sendo implementado no Brasil. Agora estão conseguindo com mais sucesso, principalmente com a pandemia e os avanços da chamada Quarta Revolução Industrial”.

Luis Fernando Laurenti, CEO da Laurenti, uma das principais fornecedores de terminais de autopagamento no Brasil, explica que um dos elementos que ajudaram a proliferar a tecnologia foi o costume adquirido pelas pessoas com os smartphones.

“Nos anos 90, algumas redes tentaram implementar o self-checkout, mas acabou sendo um fiasco. Culturalmente, a população não estava preparada”, disse. “Celular ajudou mais pessoas a saberem operar telas "touch". Trouxe familiaridade para consumidores de qualquer classe."

O executivo conta que, em 2015, a Laurenti instalou 50 terminais no ano. Já em 2021 foram mais de mil. Para 2022, a expectativa é que venda aproximadamente 1.200 máquinas de autopagamento.

Segundo ele, a empresa já tem mais de 5 mil equipamento do tipo espalhados por todas as regiões do Brasil, com maior concentração nas regiões Sul e Sudeste, mas com presença também em cidades do interior de Roraima.

“É um crescimento exponencial. Nosso foco na Laurenti é mais em supermercados, mas já vemos terminais de autopagamento em todos segmentos do varejo, desde redes de fast food a lojas de departamento”, indicou o CEO.

Ele informa que o custo médio para adquirir um terminal é de R$ 20 a R$ 25 mil, dependendo do equipamento, mas diz que as empresas também podem alugar com custo aproximado de R$ 600 por mês.

“Quando se compara o investimento versus o custo de um funcionário, é muito inferior [o custo da máquina]”.

Segundo o presidente da UGT, diante do cenário, as entidades que representam os trabalhadores buscam negociar para que os varejistas que têm mais funcionários, como os supermercados, não automatizem todos os caixas de uma vez, tornando o processo um pouco mais lento.

“Há uma grande quantidade de postos de trabalho que estão sendo colocados em cheque. O que nos resta é negociar, tentar tornar o processo mais gradual."

Para José Pastore, Ph. D. em sociologia e pesquisador nas áreas de trabalho e educação, não adianta ver o processo de automação do varejo com maus olhos.

“Isso já está contratado. A velocidade aumentou e vai acelerar muito mais. Ainda estamos com um percentual muito baixo [de automação]”.

Ex-professor titular da Universidade de São Paulo (USP), Pastore afirma que naturalmente muitas funções serão eliminadas ou drasticamente reduzidas no processo, mas destaca que a literatura sobre o tema aponta que a geração de novas vagas pode ser inclusive maior do que os empregos perdidos.

Segundo o relatório "O Futuro do Emprego", do Fórum Econômico Mundial, no período entre 2020 e 2025, 85 milhões de empregos serão eliminados em 26 países, incluindo o Brasil. Contudo, ao mesmo tempo, serão criados 97 milhões novos empregos em áreas como cuidados de saúde, tecnologias da quarta revolução industrial, economia verde, criação de conteúdo, novas tarefas na engenharia, cloud computing (computação em nuvem) e desenvolvimento de produtos.

Na visão de Pastore, portanto, o impacto mais importante e que deve ser observado atentamente pelos governos é a mudança na estrutura de ocupações.

Usando um supermercado como exemplo, ele vai além do profissional do caixa. “Um gerente de almoxarifado, por exemplo, que é uma pessoa de nível médio de educação, de salário e também de prestígio. Quando entra uma tecnologia de inteligência artificial para o almoxarifado, a função dele desaparece. Se ele não tiver se requalificado, vai trabalhar num Uber, numa plataforma de delivery. “O camarada decresce na classe social e isso tem impactos inclusive comportamentais”, observa.

O CEO da Laurenti conta que não sente gargalo de mão de obra tecnologicamente capacitada porque a parte mais complexa para o seu negócio envolve o “hardware”, e não “software”. Ou seja, ele desenvolve a parte física das máquinas, localizada em solo brasileiro, enquanto outros parceiros ligados aos clientes ficam responsáveis pelos softwares, que é o sistema pelo qual os consumidores navegam na hora de pagar as compras.

Em termos gerais, é na área de “software” que o Brasil enfrenta um sério problema de mão de obra. Nessa área, é comum ver brasileiros trabalhando em home office para empresas estrangeiras, enquanto companhias brasileiras enfrentam dificuldades para preencher vagas.

“No esteio dessa questão, vem toda a discussão sobre educação e os investimentos que precisam ser feitos na qualificação da mão de obra. Não há dúvida de que esse vetor de tecnologia vem requerendo um novo tipo de trabalho, que é exatamente aquele que torna a função humana mais nobre”, analisa o professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA), da USP.

“Estamos perdendo essa mão de obra qualificada. As pessoas que podem vão [para outros países ou trabalham para multinacionais mesmo morando no Brasil]”.

Para Felisone, cabe ao Estado (governo) arregimentar recursos para que essa necessidade seja atendida.

“A Coreia do Sul, na década de 1970, era algumas vezes mais pobre do que o Brasil. Hoje, a Coreia do Sul é muitas vezes mais rica do que o Brasil [em renda per capita]. Um dos aspectos que diferenciaram foram os investimentos em educação. Sem dúvida, existe um papel importante do Estado na equação desse problema”, diz, ressaltando que a atenção é mais para o ensino básico e médio do que para universidades.

Nesse aspecto, Pastore comenta que uma alternativa que tem se expandido é a parceria entre Estado, escolas e empresas na formação de jovens.

Para ele, os estudantes hoje precisam estar abertos desde cedo ao conceito de educação continuada.

“Essa parceria entre escola, governo e empresa é mais produtiva em termos de qualificação e requalificação de mão de obra. É um negócio complexo, mas é o que está ajudando as pessoas a ficarem menos expostas no longo prazo."

Em relação ao trabalhadores que perderão os empregos no processo de automação, os especialistas indicam que a única solução viável é a ajuda por parte de sindicatos e associações para requalificação, encontrando outras áreas de aptidão para essas pessoas em cursos técnicos.

Além disso, programas de renda mínima serão fundamentais pata amortecer as consequências.

“Nos países desenvolvidos onde essas tecnologias estão mais avançadas, quando tem descompensação, eles corrigem por meio de transferência de renda”, afirmou Pastore, dizendo que programas de renda mínima parcial como o Bolsa Família, recentemente substituído pelo Auxílio Brasil, vieram para ficar.

Fonte: Valor Invest

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