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Ribamar Oliveira: Uma vida de responsabilidade e de coerência

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O colunista do Valor, que morreu de covid-19, "vai fazer falta para muito além da imprensa", dizem Kássia Caldeira e João Domingos Uma andorinha só não faz verão. O jornalista Ribamar Oliveira propagava isso, mais que todos. A apuração solidária dos fatos traz resultados muito mais positivos para a reportagem do que quando feita por um só repórter. Ele tinha toda razão.

Como era bom ouvir aquele jeito todo próprio dele de atender telefone ou responder mensagens: “Fala, Kássia Caldeira. Fala, João Domingos”. Uma maneira de viver a vida, agregador, homem de fé e que entendia a responsabilidade em todas as suas nuances. Preocupado e dedicado à sua família, responsável na forma como acolhia amigos, tratava os colegas ou questionava um gestor público, independente do cargo, Riba tinha um modus operandi próprio, sempre correto.

Cem por cento um jornalista, o Riba vai fazer falta para muito além da imprensa. Experiente, contornava com coerência e jeito situações que afetam muitos e sempre foram problema de todos. Quando questionava ministros, secretários, governadores ou prefeitos, na verdade prestava serviço a cada brasileiro que sempre paga o pato quando a administração pública deixa de cumprir seu papel.

O compromisso do Riba com o jornalismo e com a amizade só pode ser definido como parte do caráter dele. Uma crença na verdade e na apuração jornalística coletiva que nos conduziu, no Estadão, ao prêmio Esso de Jornalismo Econômico em 1997 pela série de reportagens sobre o escândalo dos precatórios. Um tema dos mais áridos com o qual um jornalista pode se deparar, e que foi desvendado com todo cuidado pelo Riba antes que formássemos o trio vencedor do Esso. A Constituição de 1988 só permitiu que Estados e municípios emitissem títulos públicos para pagar precatórios até 5 de outubro de 1988. Mas os governos de Alagoas, Pernambuco e Santa Catarina, e os municípios de Campinas, Osasco e São Paulo, à época, desrespeitaram a determinação constitucional por intermédio de fraudes graves, como a falsificação da assinatura do presidente da República, e emitiram pelo menos R$ 3 bilhões em títulos. Muitos dos papéis foram liquidados até pela metade do preço, em operações de desvio e lavagem de dinheiro.

Durante o período das apurações jornalísticas sobre esse caso, trocávamos ideias diariamente sobre os rumos da cobertura. Hábito que ficou mesmo quando fomos trabalhar em locais diferentes. Desse modo, falávamos ao telefone com o Riba mesmo quando de férias ou em descanso com a família. “Só vou atender porque é você, tirei uns dias para descansar”, brincava nosso colega. Sua empatia com a aflição alheia sempre foi real. Ouvia, ouvia, e dava conselhos sobre quais caminhos seguir. Mas também sabia falar para que se pulasse fora da canoa, quando entendia ser o caso.

Temos muito orgulho de termos formado um trio com o Riba algumas vezes. Entender a responsabilidade parece ter sido a missão dele. Que pena ele partir num momento que tem muito assunto para ser investigado, desvendado. Num momento em que se necessita, mais do que nunca, esclarecer certos gastos públicos. Ele se foi quando cuidar da administração e da população são coisas imprescindíveis, quando nós, brasileiros, precisamos de pessoas que defendam a boa gestão pública e o bom uso dos recursos públicos, como o Riba sempre fez.

O Riba ficou quase 50 dias intubado por causa da Covid19. Morreu na terça-feira, dia 1º, poucos dias depois de completar 67 anos. A vida dele, como a de quase 500 mil brasileiros, poderia ter sido poupada se o governo central não tivesse negligenciado o vírus, sido negacionista no combate à pandemia e falhado na compra de vacinas.

Kássia Caldeira e João Domingos são jornalistas

Fonte: Valor Invest

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