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Promoção da saúde mental envolve ações globais e para todos

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Postura adequada da liderança e ambiente acolhedor e seguro devem ser somados a ações pontuais de bem-estar para surtir efeito É urgente endereçar a saúde mental dentro das organizações. A opinião é comum a todos os participantes da live “Vamos falar de saúde mental nas empresas”, que aconteceu nesta quinta, dia 29, às 14 horas. O debate foi uma iniciativa do Valor em parceria com “O Globo”, “Marie Claire”, “Época Negócios” e rádio CBN, com o patrocínio da Amil.

O problema, como comentou Stela Campos, editora de Carreira do Valor e mediadora da conversa, não é novo, mas vem se agravando. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que o Brasil é o país mais ansioso do mundo e o quinto mais depressivo, e uma pesquisa recente da Fundação Dom Cabral (FDC) e Talenses Group indica que a pandemia prejudicou a saúde mental de 73,8% dos mais de 500 profissionais entrevistados. “A gente tem visto esse problema se aprofundando e as empresas fazendo muito pouco”, afirma Carlo Pereira, diretor-executivo da Rede Brasil do Pacto Global da ONU.

Nesse sentido, foi lançado recentemente pela Rede Brasil do Pacto Global, a Sociedade Brasileira de Psicologia e a InPress Porter Novelli o movimento #MenteEmFoco. “É um espaço gratuito para as empresas levarem as melhores práticas, os bons exemplos, para outras empresas replicarem e gerar mais conhecimento nesse tema tão importante”, diz Pereira.

Trazer o tema para os holofotes é relevante para diminuir o estigma que ainda existe ao falar de saúde mental. Lisiane Bizarro, da Sociedade Brasileira de Psicologia, comenta que a origem desse estigma vem da época em que havia manicômios e que as pessoas eram encaminhadas a esses hospitais psiquiátricos para longas internações que feriam os direitos humanos. “Os avanços na área permitiram que esse modelo fosse totalmente abandonado e a gente vivesse uma nova realidade”, diz.

Além do estigma que existe na sociedade de uma forma geral, nem todo ambiente organizacional é aberto ao tema da saúde mental. Mostrar vulnerabilidade nem sempre é bem visto pelas lideranças. “O quão seguro psicologicamente é o ambiente de trabalho para permitir que o indivíduo diga que está sofrendo assédio moral, que seu sofrimento é devido a coisas que acontecem no ambiente de trabalho?”, questiona Lisiane.

Para a especialista, se há abertura e acolhimento para o diálogo, há maior chance de a queixa ser feita e endereçada de maneira coletiva pela empresa. “Se houvesse resolução, talvez muitas coisas seriam evitadas. Mas se isso não é bem recebido, a pessoa vai se acomodando com aquele sofrimento, começa a usar medicação, vai lidar com o desconforto de alguma fora, e isso gera preocupação diária do que ela vai enfrentar. Isso vai minando a vida da pessoa, e afeta sua tomada de decisão em várias esferas.”

O quadro, como menciona Lisiane, pode se agravar ainda mais. “O indivíduo em uma situação dessa se vê sem saúde e sem repertório, e tem o risco de suicídio aumentado”, comenta. O suicídio não vem apenas pela tristeza, segundo ela, pode vir pela falta de visão de possibilidade ou oportunidade. “O local de trabalho pode ser protetor, oferecendo um ambiente seguro psicologicamente, para que todas as pessoas possam falar abertamente sobre quem elas realmente são e o que sentem.”

A construção de um ambiente seguro psicologicamente passa diretamente pelo exemplo da liderança.

Leo Pinheiro/Valor

Pereira faz um comparativo ao mencionar a queda relevante dos acidentes de trabalho nas últimas décadas. “As empresas com caráter industrial têm o minuto para falar de segurança no trabalho antes de qualquer reunião”, diz. “Quando o CEO vai abrir um evento, ele sempre fala de segurança no trabalho. Isso foi internalizado de maneira efetiva na empresa. É um assunto trabalhado o tempo todo. Precisa ter isso para a saúde mental.”

Para Pereira, a mensagem tem que vir da alta liderança. “Tem que ter o CEO comprando essa questão de maneira definitiva, passando essa mensagem para a empresa.”

A forma como os gestores lidam com suas equipes também impacta a saúde mental das pessoas. “A relação entre líder e liderado sustenta muito nossa experiência com o trabalho, e isso foi alterado [com o home office]”, comenta Paul Ferreira, professor de gestão estratégica e diretor do Centro de Liderança da FDC. “Muitas decisões e microdecisões ficaram com o indivíduo, e isso agravou a situação”, exemplifica.

Ferreira cita o resultado de uma pesquisa que mostra que um dos maiores medos do profissional hoje é não ter certeza de como o líder vai acompanhar o seu trabalho. “A gente gosta de ter feedback, no Brasil especialmente, e isso foi muito alterado”, diz o professor. “Até em função disso, os executivos tendem a fazer mais, se colocando ainda mais pressão, porque há uma falta de transparência de quem tem que fazer o que.”

O impacto de transtornos de saúde mental como depressão e ansiedade é de cerca de US$ 1 trilhão para a economia global por ano, segundo a OMS. É preciso fazer algo, tanto pelo ponto de vista financeiro, como “porque é o correto a se fazer, é imperativo moral, as empresas são formadas por pessoas, e como estamos tratando essas pessoas?”, diz Pereira.

No entanto, segundo ele, apenas 18% das empresas têm um programa voltado para saúde mental. E, como lembra o representado do Pacto Global, o estresse crônico é o principal fator de risco para a saúde dos executivos.

A solução é complexa. “Quando a gente pensa em qualquer doença e estado de saúde, não se pode pensar de forma fragmentada, tem que se pensar de forma sistêmica”, diz Leandro Pereira Garcia, gerente médico sênior de gestão de saúde populacional na Amil/UHG. “As doenças têm múltiplos desencadeantes, e com a saúde mental não é diferente.”

O médico explica que as condições que levam a uma boa ou má saúde mental vão desde a vida intrauterina e a infância até o trabalho, levando em conta o propósito pelo qual se exerce a atividade, a carga de trabalho e a segurança financeira, entre tantas outras razões. Para ele, quando se fala em abarcar a saúde mental, é preciso pensar em diversos aspectos: promoção e prevenção, identificação rápida e recuperação de quadros de agravo mental e inclusão. “A pandemia do covid agravou outra pandemia que a gente já enfrenta há 30 anos e que vinha sendo silenciada por conta da estigmatização, que é a saúde mental. A gente tem a oportunidade de agora realmente escutar.”

Para Garcia, pensar apenas em ações pontuais de bem-estar como mindfulness e ginástica não é suficiente. “O mindfulness é fantástico, mas não deve ser aplicado sozinho, como solução total”, diz. “Ações que foquem o sistema de trabalho como um todo, uma liderança acolhedora, um ambiente promotor do diálogo, de confiança tanto para o CEO como para quem está dirigindo o ônibus. Quando a gente pensa na estrutura social do trabalho como um todo os resultados tendem a ser melhores. Não é que uma coisa seja contra a outra. Mas não se pode ficar com a cereja do bolo e esquecer do bolo.”

Fonte: Valor Invest

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