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Investigadora diz que apanhou com ripa de madeira em curso da polícia após pedaço de pizza sumir: "Ninguém me ajudou"

Uma investigadora maranhense de 53 anos, que pediu para não ter a identidade revelada, denunciou agressões sofridas durante um curso de táticas voltada para policiais femininas promovido pela Polícia Militar do Ceará.


Uma investigadora maranhense de 53 anos, que pediu para não ter a identidade revelada, denunciou agressões sofridas durante um curso de táticas voltada para policiais femininas promovido pela Polícia Militar do Ceará. Ela contou que na hora em que decidiu abandonar o local percebeu ali que não teria apoio. Disse estar decepcionada com as colegas que participaram com ela do curso. Só recebeu amparo na Casa da Mulher Brasileira – Delegacia da Mulher no Ceará e na corporação da Polícia Civil do Maranhão. “Muito triste com tudo isso. As meninas ficaram com medo de represálias e preocupadas em não obter a diplomação do curso. Só pode ser isso. Apanhei e, na hora que decidi desistir, por não compactuar com a violência que sofremos, não tive ninguém ao meu lado. A confusão começou quando percebeu que as outras participantes estavam sendo vítimas de agressões verbais por parte do instrutor, na hora da arrumação dos ambientes, quando o cabo da Polícia Militar do Tocantins, Rafael Ferreira Martins, teria ficado muito estressado e fora de si por conta do sumiço de um pedaço de pizza.

“Eu decidi me juntar ao grupo, para que ficássemos todas juntas na sala, uma dando apoio à outra, quando o cabo Martins, o nosso instrutor, começou a gritar: ‘Roubaram minha pizza, roubaram minha pizza, quem foi?’ Estava enlouquecido, gritando. ‘Quero todas aqui em posição de flexão agora'”, contou. “Ele me chamou de velha várias vezes e desceu a ripa em mim. Eu gritei de dor, ele ficou mais nervoso comigo e me atacou com agressões verbais, dizendo que eu não deveria ter saído do meu Estado de origem.” A denunciante explica que, além dela, outras colegas teriam sido agredidas com uma ripa de madeira. Ao todo, foram 44 policiais femininas inscritas, 21 permanecem para a conclusão do curso, 10 vagas foram direcionadas a policiais fora do Estado do Ceará — as chamadas “estrangeiras” —, segundo relatos da policial. Os módulos continuam, e a previsão de término é para o final deste mês. Ao todo são 30 dias de duração.

O cabo Rafael Ferreira Martins, suspeito pelas agressões, foi localizado pela reportagem e falou com exclusividade. Ele foi afastado do curso, mas não das funções da PM do Tocantins. Disse desconhecer tais agressões. “Meu sentimento é até difícil dizer para você. Ao longo destes nove anos que eu tenho de instituição, quase sete foram dedicados a treinar, operar e instruir. Agora vem uma pessoa que não tem respeito pela história alheia, a humildade de reconhecer a perda, fraqueza e dificuldade em desistir do curso, e tenta encontrar desculpas por não ter conseguido concluí-lo. As outras 21 alunas continuam firmes e fortes”, justificou. “Não procede o que ela está dizendo, está longe. Nem essa história de pizza existe. Temos depoimentos que serão dados, no momento oportuno, pelas instituições. As outras 21 alunas vão relatar a verdade, que nada disso aconteceu. É um sentimento de frustração, essa senhora me trouxe um prejuízo muito grande. Fiquei muito triste em ter sido afastado, me programei para ir até o final. Paguei um preço caro por esta denúncia, gostaria de ter contribuído ainda mais. Não aconteceu de jeito nenhum o que ela relatou, não tem como eu me arrepender de algo que não fiz.”

Mulher que denunciou agressões publicou fotos do corpo com hematomas (Arquivo pessoal)

Questionado sobre os hematomas que surgiram nas nádegas da policial, o instrutor alega que ocorreram vários tombos durante os procedimentos, e eles teriam ocasionado as lesões nas alunas. As policiais estavam equipadas com vários equipamentos pesados de proteção pessoal. Segundo relatos do cabo Martins, uma testemunha viu que a denunciante teve uma queda feia e se machucou. “Ela aproveitou essas lesões para levantar essa denúncia contra mim. Será que 21 alunas estão mentindo, só ela falando a verdade? As próprias alunas alegam que ela já estava desestimulada e triste com a desistência de uma amiga no início do curso. Acredito que ela inventou tudo isso para consolidar a desistência. Ela está usando essa situação, um termo que usamos no nosso meio, como ‘desculpa honrosa’, usando isso aí para justificar a saída dela, infelizmente.”

Ainda segundo relatos da denunciante, depois de ter sido agredida com ripas de madeira nas nádegas, a aluna solicitou ajuda a uma monitora identificada por ela como sargento Maia, e a mesma se manteve neutra com a situação. “No desespero, implorei ajuda para a sargento Maia, disse que iria tocar o sino e desistir do curso. Ela virou-se para mim e disse: ‘Pode bater, vai lá. Bate e sai logo’. Ela foi conivente com o agressor. O meu sentimento é de muita revolta. Nós, mulheres, não vamos aceitar mais nenhuma forma de violência e estamos cada vez mais fortalecidas.” A reportagem apurou que Maia é esposa do cabo Martins. Os dois participam juntos do direcionamento do curso (ele como instrutor, ela como monitora). “Sim, a sargento Maia é minha esposa. Mais uma testemunha que nada disso aconteceu”, disse Martins.

A investigadora supostamente agredida explicou que já participou de outros cursos táticos nos quais existem privações de sono e de comida e pressões psicológicas. E que jamais imaginou que um dia seria vítima de agressão física. “Durante o curso, tem um momento chamado de ‘semana rústica’, onde a gente não dorme, não come, sofre pressões psicológicas, fica no meio do mato, o que é normal. Mas apanhar, nunca imaginei.” Procurada para falar sobre as denúncias contra a sargento Maia, a Secretaria de Segurança Pública do Estado não respondeu aos questionamentos da Jovem Pan News. Por conta da repercussão do assunto, já que a policial denunciou o agressor e postou nas redes sociais fotos com hematomas gigantes nas nádegas, o caso foi parar no gabinete do governador Elmano de Freitas. O chefe do Executivo estadual exonerou o diretor-geral da Academia Estadual de Segurança Pública (AESP), o coronel da PM Clauber Wagner Vieira de Paula. “Inadmissível e revoltante a denúncia de agressão cometida por um policial de Tocantins, responsável por ministrar um dos módulos do Curso Tático Policial Feminino na Academia Estadual de Segurança Pública, contra uma policial civil do Maranhão”, publicou Freitas em suas redes sociais. O novo diretor-geral é o coronel José Kilderlan Nascimento de Sousa. Ele foi comandante do das Rondas de Ações Intensivas e Ostensivas (CPRaio).

A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Ceará (SSPDS) informou em nota que a Controladoria Geral de Disciplina (CGD) dos Órgãos de Segurança Pública instaurou procedimento disciplinar. A secretaria diz que “não compactua com tais condutas e salienta que todas as denúncias apresentadas passam por investigação preliminar, no intuito de que indícios de autoria e materialidade sejam colhidos para dar subsídios ao oferecimento de instrução processual e adoção de medidas cabíveis na esfera criminal”. Procurada pela reportagem, a Polícia Militar do Tocantins disse, em nota, que a supervisão do curso coube exclusivamente à instituição promotora do evento no Ceará e que já solicitou toda a documentação do caso para Secretaria de Segurança Pública Cearense. O texto diz ainda que a PM de Tocantins “repudia veemente qualquer desvio de conduta ou excesso direcionado a qualquer pessoa, praticado por policial em razão da função ou fora dela, e reafirma seu compromisso com a ética, transparência e o respeito aos direitos humanos”.

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