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Projeto de reforma tributária gera onda de protestos violentos na Colômbia; entenda

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Assim como o restante da Colômbia, Santiago de Cali foi vítima do narcotráfico entre as décadas de 1970 e 1990, mas vinha conseguindo se reerguer e atrair viajantes com suas temperaturas quentes, clubes de salsa e uma estátua de Cristo no topo de uma das muitas montanhas ao redor. A cidade colombiana poderia até lembrar o nosso Rio de Janeiro se não fosse a ausência de mar e os progressos no campo da violência. Apesar de ter registrado 45 assassinatos a cada 100 mil habitantes em 2019, a capital do Vale do Cauca conseguiu reduzir seus homicídios em 30% nos últimos vinte anos. O cientista político Márcio Coimbra, da Faculdade Presbiteriana Mackenzie de Brasília, afirma que a Colômbia teve uma “virada de chave” em comparação aos demais países da América Latina a partir da eleição de Álvaro Uribe em 2002. O combate aos cartéis, somado ao trabalho dos seus descendentes políticos Juan Manuel Santos e Iván Duque, elevou o país a uma posição de destaque internacional. Em 2018, por exemplo, a Colômbia se tornou o terceiro país latino-americano, depois do México e do Chile, a integrar a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – fórum de países comprometidos com a democracia e a economia de mercado que o Brasil tenta fazer parte há anos. “Com o combate ao narcotráfico, a Colômbia se tornou um país onde tudo funciona muito bem. Santiago de Cali, que era a base de importantes cartéis de drogas no passado, se transformou em cidades seguras, onde o turismo cresceu absurdamente”, aponta o especialista.

No entanto, o clima de estabilidade ficou para trás desde que o governo propôs uma polêmica reforma tributária no dia 15 de abril deste ano. Do dia para noite, Santiago de Cali se transformou no epicentro de protestos marcados por confrontos entre manifestantes e autoridades de segurança. O presidente Iván Duque atribuiu a violência à infiltração de antigos grupos guerrilheiros e, por isso, convocou o general-chefe do exército, Eduardo Zapateiro, para liderar a “recuperação da cidade”. Para o cientista político, essas alegações podem ter algum fundamento, visto que as Forças Armadas Revolucionários da Colômbia (FARC) continuam existindo, ainda que enfraquecidas. “Elas ainda estão presentes em diferentes regiões do território colombiano e têm apoio logístico e financeiro da Venezuela, o que deixa o governo em constante alerta em relação a milícias armadas”, afirma Coimbra. O fato é que o país rapidamente começou a presenciar cenas de guerra. A Ouvidora Geral contabiliza que até terça-feira, 4, pelo menos 19 pessoas morreram, 89 desapareceram e milhares ficaram feridas em meio aos confrontos. Ao mesmo tempo, estradas importantes foram bloqueadas, pedágios destruídos e centenas de edifícios públicos e privados acabaram incendiados. Com os caminhões impossibilitados de chegar às cidades, a exportação de café foi interrompida e as prateleiras dos supermercados começaram a mostrar escassez em uma nação já acostumada com a estabilidade política e econômica.

O especialista explica que o governo do presidente Iván Duque apresentou a proposta de reforma tributária no mês passado porque deseja compensar os auxílios sociais que se fizeram necessários durante a pandemia do novo coronavírus. “A Colômbia não queria que os gastos a mais da pandemia pudessem atravessar a reputação que o país construiu muito bem perante os credores internacionais”, acrescenta. O projeto propunha arrecadar o equivalente a 2% do PIB da Colômbia, que é a quarta maior economia da América Latina, através da ampliação da base de contribuintes, elevação de impostos, redução de isenções fiscais e aumento do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) de alguns produtos. O texto previa, por exemplo, a cobrança de pessoas que ganham mais de US$ 656 por mês, sendo que o salário mínimo do país é de US$ 248, e atualmente só são tributadas pessoas que recebem mais de US$ 1 mil. Já o IVA da gasolina passaria de 5% para 19%. Essas propostas foram rechaçadas por sindicatos, movimentos sociais e diversos setores da sociedade, que a consideraram muito onerosa para a classe média, principalmente em um momento de crise econômica. Márcio Coimbra analisa que, assim como os seus vizinhos da América Latina, a Colômbia ainda enfrenta desafios para aprovar reformas liberais. “A resistência da população é normal, porque são países colonizados, que têm uma tradição paternalista de dependência do governo. Quando as reformas mais liberais chegam e a presença do Estado diminui, a população não lida bem com isso e reage”, analisa.

Vendo que os protestos de Santiago de Cali tinham se espalhado por Bogotá e Medellín, o presidente Iván Duque ordenou no último domingo, 2, que o Congresso Nacional retirasse o projeto de reforma tributária da pauta de votações. Na segunda-feira, 3, a pressão popular também levou à renúncia do seu ministro das Finanças, o liberal Alberto Carrasquilla. Duque então começou a falar em uma nova proposta tributária, que concentraria a taxação nas empresas e classes sociais mais abastadas em caráter temporário. O problema é que, dessa forma, ele arrisca perder o apoio que recebe das elites colombianas e continua não conseguindo abafar as manifestações, que prosseguiram nos últimos dias com novas reivindicações, principalmente de melhorias nos campos da educação, saúde e segurança. A reação aos protestos também está prejudicando a sua imagem no exterior: o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos disse estar “alarmado” com os acontecimentos na Colômbia e condenou o “uso excessivo da força” contra os manifestantes, lembrando que as armas de fogo devem ser utilizadas pelas autoridades locais “apenas como último recurso”. Apesar de tudo isso, Coimbra acredita que a crise deve ser passageira. “Como a Colômbia tende a ser um país mais tranquilo, é possível supor que essa agitação tenha sido influenciada pela pandemia do novo coronavírus e possua algum reflexo nos protestos que aconteceram no Chile ente 2019 e 2020. Mas eu acho que as manifestações na Colômbia tendem a arrefecer com muito mais tranquilidade em comparação ao caso chileno”, defende.

Fonte: Jovem Pan

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